Torcida Alemã e Confusões Geográficas

Segue artigo meu publicado no Jornal Evolução do dia 02.07.2010:

Torcida Alemã e Confusões Geográficas


Em época de Copa do Mundo, é comum encontrar nas cidades do sul do Brasil pessoas torcendo pelo país de origem dos seus antepassados – em especial a Alemanha. O fenômeno também está presente em São Bento do Sul, cidade que, entre outras etnias, foi colonizada por imigrantes de origem germânica. Em nossa cidade, a torcida pela Alemanha simplifica uma grande confusão geográfica em que nos metemos.

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Isso porque a maior parte dos nossos imigrantes não veio do atual território alemão – e eles tampouco se consideravam alemães. Esses imigrantes tinham como origem o Reino da Boêmia, que na época integrava o chamado Império Austro-húngaro. Ao chegar em São Bento, os boêmios qualificavam-se como austríacos, e não alemães. E por muito tempo ainda cultivaram um forte sentimento de pertencimento à Áustria, a ponto de realizarem grandes desfiles e comemorações no dia do aniversário do imperador austríaco.

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Esses austríacos, no entanto, eram descendentes de famílias que vinham do atual território da Alemanha. A partir do século XII, a nobreza boêmia começou a incentivar a vinda de alemães para ocupar o seu território. Assim, os bávaros se fixaram nas regiões sul e leste, os saxões no norte e os silesianos no oeste da Boêmia. Os imigrantes de São Bento do Sul descendem de famílias que, em algum momento, fizeram essa mudança. Mas eles mesmos não eram propriamente alemães, embora pudessem compartilhar da mesma cultura.

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Deveríamos então torcer pela Áustria, uma seleção que anda mal das pernas e sequer está na Copa? Não exatamente. Afinal, o antigo Reino da Boêmia não fica mais na Áustria. Quando o Império Austro-húngaro foi dissolvido, após a 1ª Guerra Mundial, a Boêmia passou a fazer parte da Tchecolosváquia. E desde 1993 o território boêmio faz parte da República Tcheca. Os tchecos possuem uma seleção melhor, mas nem por isso precisamos torcer por eles. Isso porque os povos de origem germânica que ocupavam a Boêmia foram expulsos de lá após a 2ª Guerra Mundial – e voltaram para a Alemanha.

Em resumo, nossos imigrantes eram austríacos de origem germânica que habitavam a atual República Tcheca. Dessa confusão se conclui que a identidade germânica de São Bento se faz de maneira étnica e cultural, mas não necessariamente geográfica. Talvez a tentativa de enquadrar a cidade em um roteiro de imigração alemã tenha simplificado a origem de nossos ancestrais. Embora possa parecer mera sutileza, a especificação é útil para demarcar a nossa identidade. São Bento é a única cidade no estado colonizada principalmente por boêmios. Essa é a nossa particularidade, e nela devemos insistir.

Existiram também imigrantes de origem germânica vindos da Prússia e da Pomerânia, regiões que hoje fazem parte da Polônia –  também ausente na Copa. Antes que a confusão aumente, o melhor que podemos fazer é nos apoiar naquilo que temos certeza: nascemos todos no Brasil, a mesma pátria escolhida pelos imigrantes e, sendo assim, é por ele que torcemos.

Henrique Luiz Fendrich

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