Folha do Norte: As índias dos Fragoso

Coluna “São Bento no passado”,  publicada no jornal Folha do Norte de 12.03.2013.

As índias dos Fragoso

Nem todo mundo sabe mas, antes mesmo dos imigrantes chegarem, já havia brasileiros morando na região de São Bento do Sul e Campo Alegre. Uma destas famílias era a família Fragoso, que já estava na região ao menos desde 1865. Inclusive, um dos tropeiros que auxiliaram os primeiros imigrantes a subirem a serra Dona Francisca foi João Fragoso. A família habitava os lados catarinense e paranaense do Rio Negro. Manoel Soares Fragoso, curitibano, mas morador da Lapa, trouxe consigo filhos e netos que se espalharam pelo lugar. Um dos seus netos, Generoso Fragoso, é tido até hoje como “fundador” de Fragosos. Na verdade, foi apenas mais um dos pioneiros.

A família Fragoso tem origem no relacionamento de um paulista de Taubaté, chamado João Soares Fragoso, com uma índia carijó de Curitiba, chamada Páscoa das Neves. Os carijós, pertencentes ao grupo guarani, eram tidos como índios mais dóceis. Isso deve ter facilitado que os primeiros curitibanos os aprisionassem e os mantivessem cativos em suas casas. Eram chamados então de “administrados” – na prática, um eufemismo para escravos.

A índia Páscoa das Neves era filha de outra índia chamada Ventura e neta da índia Valéria, que deve ter nascido em Curitiba por volta de 1670 – antes mesmo da fundação oficial da cidade. João Soares Fragoso teve apenas um relacionamento casual com Páscoa. Alguns anos depois, ele se casou com uma das filhas do seu proprietário. Mas Páscoa teve com ele um filho, chamado Domingos Soares Fragoso. Um dia João Soares Fragoso se mudou com sua família legítima para a região de Castro. Domingos, filho bastardo, permaneceu em Curitiba morando com a família da mãe índia.

Este Domingos se tornou ancestral de todos os Fragoso que hoje habitam a região de São Bento do Sul e Campo Alegre. De Curitiba a família se espalhou por todo o sul do Paraná e norte de Santa Catarina, chegando até mesmo ao oeste do estado.

A gravura abaixo, feita em 1559 por Ulrich Shmidl, retrata um grupo de carijós.

As três índias dos Fragosos

Índios Carijó (Guarani), os habitantes nativos. Gravura de Ulrich Schmidl - 1559

Índios Carijó (Guarani), os habitantes nativos. Gravura de Ulrich Schmidl – 1559

Até mesmo de forma pejorativa, os primeiros brasileiros de São Bento do Sul costumaram receber ao longo da história a alcunha de “caboclos”, termo que designa o mestiço do branco com o índio, sem que ninguém se dispusesse a investigar as origens de cada família para verificar se, de fato, o termo era o mais adequado. Considerando a família Fragoso, uma das primeiras a habitar a região (um Fragoso inclusive ajudou os imigrantes de São Bento a subirem a serra Dona Francisca), minhas pesquisas evidenciam que a origem procede – isto é, existe relacionamento de branco com índio no passado da família. E melhor do que isso: sabemos o nome e alguns detalhes da vida de três gerações de antepassados indígenas.

Os Fragoso possuem origem mais remota em Curitiba. A capital paranaense começou a ser povoada alguns anos antes de 1661, ocasião em que lá já moravam as famílias Balthazar Carrasco dos Reis e Matheus Leme. Interessa-nos, neste caso, especialmente a figura de Balthazar, um bandeirante nascido em São Paulo. Ao decidir se estabelecer em Curitiba, é bastante provável que tenha travado contato com os indígenas que já habitavam a região, e que, ao que tudo indica, eram carijós, pertencentes ao grupo guarani. Há literatura sugerindo que os índios carijós eram mais dóceis, o que deve ter facilitado o seu apresamento. Sendo Balthazar um bandeirante, também ele manteve sob sua guarda em Curitiba alguns (provavelmente muitos) desses índios – e, conforme o pensamento da época, acreditava ser essa a atitude mais correta. Viravam então “administrados”, sendo utilizados no serviço doméstico da casa.

Balthazar Carrasco dos Reis, um dos pioneiros de Curitiba e proprietário de índios administrados.

Balthazar Carrasco dos Reis, um dos primeiros moradores de Curitiba e proprietário de índios administrados.

É de se imaginar que, conforme os filhos de Balthazar casavam, recebiam os seus próprios índios entre aqueles que o pai mantinha. Uma de suas filhas se chamava Maria das Neves e ela se casou com Guilherme Dias Cortes. Este casal foi proprietário de uma índia chamada Valéria – e ela, como especulamos, deve ter origem nos índios capturados por Balthazar Carrasco dos Reis. Valéria deve ter nascido próximo ao ano de 1670, o que sugere que também os seus pais, de nomes desconhecidos, já estivessem sob a administração dos Carrasco dos Reis.

Valéria cresceu e teve também os seus filhos. No caso de índios administrados, que não eram casados na Igreja Católica, os padres omitiam o nome do pai no momento de batizar um filho. Por isso, só conhecemos as gerações femininas nesta genealogia indígena. E Valéria, no dia 18.08.1691, batizou uma filha chamada Ventura. Também a criança passava agora a ser propriedade da família de Guilherme Dias Cortes.

Os anos passaram e a índia administrada Ventura também cresceu e teve filhos, cujos pais, do mesmo modo, não são informados nos registros de batismo – sabe-se, no entanto, que uma das filhas de Ventura, provavelmente a primeira, chamada Izabel, foi tida com o conhecido Capitão João Carvalho de Assunção. Na ocasião, Ventura tinha apenas 17 anos. Entre os filhos de Ventura esteve uma menina chamada Páscoa das Neves, batizada em Curitiba no dia 01.01.1722. Por essa época, Guilherme Dias Cortes já era falecido, mas Ventura e a filha Páscoa continuavam sendo administradas da família (sobre a avó Valéria não temos informações se ainda vivia ou não).

Próximo ao ano de 1725, uma das filhas de Guilherme Dias Cortes, chamada Joanna Garcia das Neves, contraiu matrimônio com João de Siqueira Chaves. Talvez por conta deste evento, alguns dos índios que haviam pertencido a Guilherme Dias Cortes passaram para a propriedade de João de Siqueira Chaves. Entre eles estava a índia Ventura, além da filha Páscoa e, imagina-se, de seus irmãos.

Assim como a mãe, Páscoa das Neves teve o seu primeiro filho, chamado Antônio, aos 17 anos de idade. Dele não se conhece o pai. Seis meses depois do registro de batizado de Antônio (o que sugere erro), aos 25.01.1740, a mesma Páscoa das Neves aparece como mãe do menino Domingos, tida com João Soares Fragoso, homem branco, natural de Taubaté, filho de Álvaro Soares Fragoso e Catharina Garcia de Unhatte, e que na ocasião devia contar com cerca de 20 anos. Esta é a informação que confirma a mistura entre índios e brancos na origem dos Fragoso, pois os membros dessa família em Campo Alegre são todos descendentes desse mesmo relacionamento.

Provavelmente, esse relacionamento não passou de uma aventura para João Soares Fragoso, que não deve nunca ter cogitado oficializar algum tipo de união com Páscoa das Neves. No ano de 1742, Páscoa das Neves teve outra criança, chamada Ângela, mas agora tendo como pai Antônio Álvares. Ângela viveu apenas 8 anos. João Soares Fragoso, por sua vez, casou-se em Curitiba aos 04.02.1745 com Ignez de Chaves, justamente uma das filhas de João de Siqueira Chaves – ou seja, o proprietário de Páscoa das Neves.

Aos 20.07.1747, quando Domingos, o filho bastardo de João Soares Fragoso, contava com 7 anos, ocorreu o falecimento de sua avó Ventura, com a idade de 55 anos. Na ocasião, João Soares Fragoso já havia tido dois filhos legítimos com sua esposa (Maria e João Francisco). No ano seguinte teria ainda outro, chamado Miguel. Depois disso, podemos especular que entre os anos de 1749-1752, João Soares Fragoso mudou-se para a região dos Campos Gerais, tendo batizado seu filho Manoel na Capela de Santa Bárbara do Pitangui, na atual Ponta Grossa, e anos mais tarde aparecendo como proprietário de um sítio em Furnas, a 7 léguas da povoação de Iapó. Em Castro, João Soares Fragoso teria ainda os filhos Silvestre e Alexandre Soares de Chaves, que depois partiria para o Rio Grande do Sul.

Mas, ao que tudo indica, o filho bastardo Domingos Soares Fragoso (único dos filhos de João a portar o seu sobrenome exato) não acompanhou o pai quando ele saiu de Curitiba. Provavelmente ficou na companhia da mãe e seus familiares, todos ainda sujeitos à administração da família de João de Siqueira Chaves. No entanto, aos 26.08.1752, contando Domingos com pouco mais de 12 anos, ocorreu o falecimento de sua mãe Páscoa das Neves, com cerca de 30 anos. Morria, assim, a mais nova das três índias conhecidas que são antepassadas desta família Fragoso.

Não sabemos  de que maneira e com quem viveu Domingos Soares Fragoso a partir de então, pois só voltamos a encontrá-lo treze anos depois, aos 30.10.1765, quando ele próprio contraiu casamento em Curitiba. Sua noiva chamava-se Maria Dias Camacho e, muito provavelmente, também possuía origem indígena. Ao nascer, tendo como pai um ainda misterioso Francisco Dias Camacho e uma mãe desconhecida, Maria foi abandonada à porta da casa de Ignácio Preto Bueno, paulista, de família tradicional e com muitas posses. Lá foi criada até o dia do casamento com Domingos.

Do casamento de Domingos e Maria nasceram todos os Soares Fragoso que, ao longo das gerações, se espalharam por toda a região metropolitana de Curitiba, tendo alguns alcançado até mesmo Guarapuava, além daqueles que partiram para Santa Catarina, onde estiveram em praticamente toda a região norte, e até mesmo cidades do oeste. É bastante singular que o sobrenome Soares Fragoso, ainda mais por ser nome duplo, perdure por todo esse tempo.

Este é, até o momento, um resumo sobre aquilo que se sabe a respeito da ascendência indígena da família Fragoso de nossa região de São Bento do Sul e Campo Alegre.

Os brancos e morenos da família Fragoso

Antigamente, os escrivães achavam importante mencionar em seus assentos a cor da pele das pessoas que registravam. Hoje em dia, quando essa distinção não faz mais o menor sentido, a menção é útil apenas para descobrirmos mais sobre as características físicas de nossos antepassados, sem que nenhum tipo de juízo de valor se faça necessário. Motivado por essa curiosidade, e aproveitando ser essa a família que mais detalhes possuo, tratei de verificar as indicações de cor em membros da família Fragoso.
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Antes de tudo, eu já sabia que os Fragosos descendem de índios carijós, aprisionados pelos branquíssimos curitibanos. Desse cruzamento já era de se esperar que não fossem totalmente brancos. Existem, no entanto, 4 gerações separando Generoso Fragoso de Oliveira, um dos primeiros moradores de Fragosos, de Domingos Soares Fragoso, mameluco, filho de índia. Talvez a herança genética já fosse perdida. Ressalta-se que do ramo do pai de Generoso não temos muitas informações.
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Em geral, os registros que informam a cor são os de óbitos. Não descobrimos através dele a cor de Generoso Fragoso, falecido em 1924. Passamos a consultar os registros dos seus filhos. Do primogênito Saturnino, de quem descendo, também não há indicação da cor. De seu irmão Gregório não encontramos o assento. Já os irmãos Pedro Rodrigues de Oliveira, Valêncio Soares Fragoso e Ernesto Crescêncio Fragoso eram todos brancos ou de cor clara, conforme registrado. Houve, no entanto, uma exceção: o irmão Joaquim Rodrigues Fragoso aparece como sendo de cor morena, único caso entre os filhos de Generoso Fragoso.
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Da mãe de Generoso, Francisca Soares, também não foi possível descobrir a característica, e nem a dos seus irmãos. Como descendo também do irmão caçula de Francisca, Felippe Soares Fragoso, tentei verificar se havia indicação de cor nos seus filhos. Para Joaquina, minha trisavó, não há. Para Angelina e João Isidoro, não foram encontrados os registros de óbito. Para Francelina, a informação é de que era branca. Mas seus irmãos Pedro e Flora Lina aparecem com a cor morena, o que também sugere pouca uniformidade nessa característica entre os descendentes de Felippe Soares Fragoso.
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Infelizmente, não sei dizer, portanto, a cor dos meus ancestrais Saturnino Fragoso de Oliveira e sua esposa Joaquina Fragoso Cavalheiro. Eles tiveram seis filhos, dos quais apenas dois possuem registro de óbito conhecido. E, tornando a coisa mais difícil, uma delas (Catharina) era branca e outra, apesar do nome (Maria Clara), era morena.
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Luiz Thomé Fragoso, filho de Saturnino e neto de Generoso, parece representar bem o tom de pele da família entre o branco e o moreno. 
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Essas são considerações preliminares a respeito da cor entre os membros da minha família Fragoso, e que até o momento não permitem chegar a outra conclusão que não a de que nasciam brancos e morenos. É preciso levar em conta ainda que a classificação apontada nos registros pode não ser necessariamente a verdadeira, mas aquela que alguém achou pertinente.

Crônica da Família Fragoso

A história da família Fragoso na região de São Bento do Sul e Campo Alegre começa em terras paulistas. Foi lá, mais precisamente em Taubaté, que nasceu, por volta de 1719, João Soares Fragoso, filho de Álvaro Soares Fragoso e Catharina Garcia de Unhatte. Em data ignorada, mas certamente antes de 1740, João Soares Fragoso já estava na cidade de Curitiba, aparentemente longe de familiares. E foi na capital do Paraná que João se encantou por uma índia carijó chamada Páscoa das Neves. Os carijós eram índios pacatos e trabalhadores, e que se transformaram em escravos dos curitibanos desde o começo da colonização pelo homem branco na região, ainda no século XVII.

Com a índia, João Soares Fragoso teve um filho, chamado Domingos, nascido em 1740. Foi provavelmente um relacionamento ocasional, sem maiores responsabilidades para João. Tanto é assim que cinco anos depois ele estaria contraindo matrimônio, e por coincidência com uma filha do proprietário de Páscoa das Neves, chamada Ignez de Chaves. Com sua esposa, João teve diversos filhos em Curitiba, até um dia se mudar para os Campos Gerais.

Domingos, que não era filho legítimo, não acompanhou o pai. Permaneceu em Curitiba. Aos 12 anos, ele viu a sua mãe morrer. Quando se tornou maior, escolheu a sua esposa: Maria Dias, uma pobre mulher, que havia sido abandonada ao nascer – provavelmente porque também era filha de índia. Os dois tiveram diversos filhos em Curitiba. Maria faleceu em 1806 e, embora já em idade avançada, Domingos se casou novamente, no ano seguinte, com Isabel Cardosa.  Entre os filhos que teve com Maria está um de nome Theodoro. Este, cresceu, arrumou casamento com Feliciana Rodrigues França (1787-?), teve filhos com ela, e um dia, antes de 1836, quando já era velho, resolveu se mudar para a Lapa.

Na hoje legendária cidade paranaense, Theodoro era um simples lavrador que colhia milho e feijão para o sustento. Não morou muito tempo lá, pois acabou falecendo poucos anos depois, em 1839. Um dos filhos de Theodoro se chamava Manoel, nascido em 1805, e que portanto já era um homem feito, inclusive casado quando a família se mudou para a Lapa. Sua esposa se chamava Maria Marciana de Marafigo (1804-?). Nessa cidade, Manoel viveu até morrer, em idade ignorada, entre os anos de 1858 e 1865. Vários dos seus filhos, no entanto, foram inquietos o bastante para procurar novos lugares.

E foi assim que, já em 1868, e talvez um pouco antes, seus descendentes começaram a ocupar a região que hoje conhecemos por Fragosos. Pelo pioneirismo, foram eles, inclusive, que construíram a primeira ponte sobre o rio Negro. Citamos a seguir esses filhos de Manoel Soares Fragoso:

1. Francisca Soares Fragoso (1827-1911), a primogênita, viúva de Hermenegildo Rodrigues de Oliveira, casada com João dos Santos Machado. Ela e seu primeiro esposo são os pais de Generoso Fragoso de Oliveira, tido pela tradição oral de nossos dias como “fundador de Fragosos”.  No total, Francisca teve 3 filhos com Hermenegildo e outros 3 com João.

2. Virgínio Soares Fragoso (1829-1905), casado com Escolástica Maria de Jesus, e em segundas núpcias com Anna dos Santos Lima. Pela terceira vez, casou-se em 1889 com Francisca Pereira de Oliveira. Ao que se sabe, Virgínio teve quatro filhos.

3. José Soares Fragoso (1831-antes de 1893), casado com Rosa Calisto de Camargo. São os pais de João Elias Fragoso, personagem que figura em páginas sombrias na história de São Bento do Sul. Além dele, o casal teve ao menos três filhas.

4. Pedro Soares Fragoso (por volta de 1833-1887), casado com Gertrudes Maria de Camargo. O casal teve ao menos seis filhos. Entre seus descendentes está o ramo Machado Fragoso.

5. Maria da Rosa Soares (1836-?), filha que, ao que tudo indica, não acompanhou os irmãos, tendo permanecido na Lapa, onde já devia se encontrar casada com Antônio José Mariano da Silva. Tiveram ao menos quatro filhos. Seus descendentes levaram a alcunha Soares da Silva.

6. Joana Soares Fragoso (1839-antes de 1891), casada com Antônio Rodrigues de Almeida. Foram pais de ao menos 4 crianças. Os Rodrigues de Almeida se cruzaram diversas vezes com os Fragoso e com os Cavalheiro. Um filho do casal, Lino Rodrigues de Almeida, chegou a ser vereador em São Bento do Sul.

7. João Baptista Fragoso (por volta de 1843-antes de 1910), casado com Maria da Glória,  e, depois de viúvo, com Rufina Pereira. Ao que se sabe, teve seis filhos com a primeira esposa e duas com a segunda. Ele e sua primeira esposa são ancestrais dos inúmeros Baptista Fragoso que ainda em nossos dias habitam a região de Fragosos e Piên. É provável que seja o mesmo João Fragoso apontado como um dos tropeiros a auxiliar a subida dos imigrantes para a recém-fundada colônia de São Bento.

8. Felippe Soares Fragoso (1846-antes de 1902), casado com Flora Lina Cavalheiro e, viúvo dessa, com Anna Muniz de Sant’Anna. Teve 5 filhos com a primeira esposa e 1 com a segunda. Tiveram descendentes que levaram o sobrenome Fragoso Cavalheiro. A primeira esposa de Antônio Kaesemodel, Verônica Dranka, era neta de Felippe.

Nos dias de hoje, como dito, a fama de “fundador de Fragosos” caiu sobre Generoso Fragoso de Oliveira, que muito provavelmente, devia estar entre os primeiros membros da família que se estabeleceram na região. Apesar disso, certamente não é possível atribuir a ele, ou a qualquer pessoa isoladamente, a fundação do lugar.

É bem possível que a sua fama esteja relacionada com um certo sucesso como negociante, além de seu envolvimento com figuras políticas da época, como João Filgueiras de Camargo e Francisco Bueno Franco, somando-se a isso o fato de ter morrido em Fragosos com avançada idade. Existe, em sua homenagem, uma rua no bairro.

De grandes proprietários na região, aos poucos os Fragosos se viram obrigados a se desfazer de suas terras. Os filhos de Generoso Fragoso de Oliveira, por exemplo, já possuíam muito menos que o pai. Os netos pegaram uma parcela ainda menor. E, nos dias de hoje, os bisnetos não possuem quase nada.

Hoje os Fragoso sofrem a falta de investimentos na região. Antigamente, os moradores de Fragosos iam até São Bento para vender aquilo que produziam em suas terras. Atualmente, vão até lá apenas para comprar.

Histórias de Fragosos II – A Família Fragoso

O nome da localidade de Fragosos, naturalmente, tem sua explicação na pioneira ocupação da região por membros da família Fragoso. Essa família vinha de São José dos Pinhais e da Lapa. Mais remotamente, suas origens apontam para a cidade de Curitiba e, de lá, para Taubaté, no interior paulista. Os Fragosos também possuem ancestrais indígenas – carijós que foram aprisionados pelos primeiros curitibanos.

Os membros da família Fragoso que primeiro chegaram à região eram filhos e netos de Manoel Soares Fragoso, natural de Curitiba, onde se casou com Marciana Maria de Marafigo, do mesmo lugar, com quem se mudou para São José dos Pinhais e, mais tarde, para a Lapa. Foram seus filhos:

1. Francisca Soares. Nasceu em 1827 na cidade de Curitiba. Casou-se na Lapa por volta de 1844 com Hermenegildo Rodrigues de Oliveira, com quem teve, entre outros, o filho Generoso Fragoso de Oliveira, tido pela tradição oral como primeiro morador de Fragosos, conforme já tratamos aqui. Viúva, casou-se em 1854 com José dos Santos Machado. Não há evidências de que esteve em Fragosos, mas seus filhos dos dois casamentos lá estavam.

2. Virgínio Soares Fragoso, nascido em São José dos Pinhais no ano de 1829. Em São Bento do Sul, casou-se pela terceira vez, no ano de 1889, com Francisca Pereira de Oliveira. Comprovadamente, esteve em Fragosos.

3. José Soares Fragoso, nascido em Campo Largo no ano de 1831. Também morou na região de Fragosos, onde deixou descendência, entre eles o temido João Elias Fragoso, acusado de ser o executor dos assassinatos de João Filgueiras de Camargo e Alberto Malschitzky.

4. Pedro Soares Fragoso, morador de São José dos Pinhais, tendo depois migrado para Fragosos, conforme se depreende do seu registro de óbito. Seus descendentes se uniram às famílias Rocha e Machado.

5. Maria da Rosa Soares, nascida na Lapa em 1836. Tudo leva a crer que não esteve em Fragosos, mas que, casada com Antônio José Mariano da Silva, continuou morando na cidade da Lapa, onde deixou a sua descendência.

6. Joana Soares Fragoso. Casou-se com Antônio Rodrigues de Almeida. Não podemos afirmar que o casal, propriamente, esteve em Fragosos, mas seus descendentes sim. O filho Lino Rodrigues de Almeida chegou a assumir o cargo de vereador em São Bento.

7. João Baptista Fragoso. Nascido na Lapa, também se mudou para Fragosos. É ancestral de todos os numerosos Baptista Fragosos que, até os nossos dias, ocupam a região.

8. Felippe Soares Fragoso, nascido na Lapa em 1846. Tudo indica que continuou morando na região. Deixou descendentes que moraram em Fragosos, como a filha Joaquina Fragoso Cavalheiro, casada com um filho de Generoso Fragoso, e Francelina Fragoso Cavalheiro, sogra de Antônio Kaesemodel. Na sua maioria, os Cavalheiro da região são descendentes seus e de sua primeira esposa Flora Lina Cavalheiro.

Desses filhos de Manoel Soares Fragoso descendem, ao que nos consta, todos os Fragosos que hoje habitam a localidade. Houve membros da família Fragoso de outros ramos, conectados apenas em Curitiba, mas que chegaram à região de São Bento do Sul por outras frentes.

Famílias Carneiro e Fragoso

As famílias Carneiro e Fragoso estiveram entre as primeiras que ocuparam a região de São Bento do Sul/Campo Alegre. As duas possuiam suas origens na cidade de São José dos Pinhais. Mais remotamente, a genealogia dos Carneiro aponta para Antonina e, talvez, São Francisco do Sul. A história familiar dos Fragoso, por sua vez, alcança a Lapa, depois volta para Curitiba e então chega a Taubaté. A pioneira ocupação das duas famílias deve ter feito com que possuissem uma boa quantidade de terras, razão pela qual tanto Carneiros quanto Fragosos tiveram os seus sobrenomes usados para designar os locais que suas famílias ocupavam.

Em 1876 e 1877 o pároco Karl Boegershausen, ao se referir à ermida de Santo Antônio, localizada em Avenquinha, complementava esclarecendo que ficava “nos Carneiros”. Documentos posteriores não repetem a denominação, no entanto. Situação bem diferente aconteceu com as famílias que moravam “nos Fragosos”. A localidade, que não fica longe da Avenquinha dos Carneiro, possui o seu nome mantido até os dias atuais.

Ao consultar as leis e decretos-leis que diziam respeito à configuração territorial de São José dos Pinhais (COLNAGHI, 1992), encontrei duas referências a Carneiros e Fragosos, uma em 1874 e outra em 1876. Nesses anos, as propriedades das duas famílias são citadas como referências para definir os limites territoriais que separavam São José dos Pinhais de Santa Catarina. As descrições, no entanto, não são tão claras a ponto de se definir com precisão, depois de tanto tempo, quais eram os contornos exatos dessas demarcações e a quais lugares elas correspondem na atualidade. É necessário um grande conhecimento da hidrografia local da época, e muitas vezes nem assim.

Em 1874, os limites de São José dos Pinhais eram, conforme a Lei nº 402, de 13 de abril, com grifos nossos:

Art 1º. – Ficam determinadas, entre os municípios de São José dos Pinhais, Lapa e Rio Negro, as divisas seguintes: Principiando da barra do Ribeirão Izabel Alves e subindo por ele até a barra do Ribeirão das Porteiras; deste ribeirão e por ele acima até a sua principal cabeceira e daí à rumo direito a chegar no paiol de Veríssimo Gonçalves Cardoso; e do paiol à rumo direito pelas divisas dos terrenos de João Ferreira de Lima; deixando estes terrenos à esquerda até sair na estrada da Roseira; seguindo esta até o Ribeirão Turvo e por este baixo até o Rio da Várzea, e subindo por este até a barra do Rio Pangaré e daí, por ele acima, até a cabeceira, e desta à rumo direito no Rio Piên e por este abaixo até o Rio Negro, subindo por este até a barra do Ribeirão dos Passos que igualmente serve de divisa entre as propriedades dos Carneiros e Fragosos;  subindo o Ribeirão dos Passos até sua cabeceira e desta à rumo da Serra Geral, limite desta Província com a de Santa Catarina.

A lei nº 463 de 15 de abril de 1876 novamente estabelece os limites, citando o Ribeirão que fazia divisa entre as propriedades de Fragosos e Carneiros. Mas, dessa vez, a transcrição o dá como Ribeirão dos Poços, e não dos Passos:

Art. 1º – Ficam determinadas entre os municípios de São José dos Pinhais, Lapa e Rio Negro as divisas seguintes: Principiando da barra do Ribeirão Izabel e subindo por ele até a barra do Ribeirão das Porteiras, deste ribeirão e por ele acima até a sua principal cabeceira e daí à rumo direito a chegar ao paiol de Veríssimo Gonçalves Cordeiro, do paiol à rumo direito, pelas divisas dos terrenos de José Ferreira de Oliveira, deixando estes terrenos à esquerda, até subir na estrada da Roseira, atravessando esta a procurar o paiol de João Preto, seguindo pela estrada dos Limas até o Ribeirão do Barco, e por este abaixo até sua foz, no Rio da Várzea e subindo por este até a confluência do Ribeirão Água Clara e por este acima até a sua última cabeceira da esquerda, e desta a procurar o paiol Aterrado Alto, por uma estrada velha até a cabeceira do Ribeirão dos Faxinais e por este abaixo até o Rio Negro, e seguindo por este até a barra do Ribeirão dos Poços, que serve de divisa entre as propriedades dos Carneiros e Fragosos; e subindo o Riberão dos Poços até sua cabeceira e desta, à rumo direito Serra Geral.

Um Rio do Passo também aparece na lei nº 172 de 14 de abril de 1868: “… passando pelo rio do Passo, entre Pedrinhas e Pão de Lot e do Rio da Cachoeira…“. No ano seguinte, a lei nº 194 de 31 de maio alterava o nome Rio do Passo para Rio do Poço. O que sabe com certeza é que, modernamente, não existe nenhum rio com esses nomes.

Uma leitura mais apurada dessas leis pode, com o tempo, permitir que se localize melhor as propriedades pertencentes a duas famílias importantes no povoamento da região.

Referências: COLNAGHI, Maria Cristina; MAGALHÃES, Marionilde Dias Brepohl de;  MAGALHÃES FILHO, Francisco de Borja Baptista de. São José dos Pinhais – A Trajetória de Uma Cidade. Editora Prephacio: Curitiba, 1992.

Os Brasileiros de São Bento do Sul

 Artigo publicado no jornal A Gazeta, de 23 de setembro de 2008

 

Os imigrantes que chegaram há 135 anos em São Bento do Sul, vindos de regiões germânicas e polonesas, construíram uma história que é, merecidamente, sempre lembrada pelos historiadores. Mas além deles, há de se considerar também a presença de “brasileiros” na região. Eram paranaenses vindos de São José dos Pinhais e da Lapa. Algumas dessas famílias moravam na região desde o começo. Francisco Antônio Maximiano, por exemplo, apresentou um título de posse emitido no Paraná em 1872 para o lote que ocupava, e que também estava previsto para os imigrantes de São Bento.

As famílias nacionais não habitavam o núcleo central da cidade. Muitas moravam próximas à Estrada Dona Francisca, ou em bairros como Mato Preto, Fragosos, Avenquinha e Bateias – que pertenciam à São Bento. A distância não impediu que os dois grupos se relacionassem. Embora sempre se evidencie os conflitos de terras, o cronista Josef Zipperer, um dos primeiros imigrantes, relata importantes interações entre os grupos. Era dos brasileiros de Avencal, por exemplo, que os alemães recém-imigrados compravam (a prazo) os mantimentos que faltavam, como feijão, carne seca e farinha de milho.

Há vários casos em que as duas etnias mantinham laços de amizade. João Filgueiras de Camargo, que chegou a ser prefeito de São Bento, morava em uma casa construída em estilo germânico por carpinteiros alemães, em Fragosos. Também foram muitos os casos de brasileiros padrinhos de filhos de imigrantes, e vice-versa.

Os brasileiros também se destacaram na área política de São Bento, que não despertou muito interesse dos imigrantes. O primeiro prefeito da cidade, por exemplo, foi Francisco Bueno Franco, natural de São José dos Pinhais. A maioria dos primeiros cargos públicos foram ocupados por nacionais que moravam nas proximidades. Eles descendem das primeiras famílias de Curitiba e Paranaguá, as quais, por sua vez, descendem dos primeiros paulistas. Além dos citados, entre os primeiros nacionais destacaram-se Antônio dos Santos Siqueira, Thomas Umbelino Teixeira, Francisco Teixeira de Freitas, Amâncio Alves Correia, José Affonso Ayres Cubas, Cândido José Munhoz, Generoso Fragoso de Oliveira, e muitos outros, alguns com descendência na cidade até os nossos dias. Ao comemorar o aniversário de São Bento, convém lembrar também desses nomes que, junto com os imigrantes, fizeram parte da história da cidade em seus primórdios e ajudaram a contribuir para o seu desenvolvimento.

 

Henrique Luiz Fendrich

Da Lapa a São Bento do Sul

Da cidade da Lapa vieram muitas familias para São Bento do Sul

Da cidade da Lapa vieram muitas famílias para São Bento do Sul

Muito pouco tem se falado sobre os primeiros brasileiros de São Bento do Sul – alguns já estavam na região quando chegaram os imigrantes, em 1873. Embora não habitassem a área central da cidade, os brasileiros eram a maioria em bairros como Mato Preto, Fragosos, Avenquinha e Bateias – na época, todos pertencentes a São Bento do Sul. Os livros de registros da Igreja Católica da cidade apontam um equilíbrio entre assentos de brasileiros e de imigrantes – talvez até em número superior para o elemento nacional.

A maior parte desses brasileiros, tidos, talvez até pejorativamente, como caboclos, vinha de São José dos Pinhais. Outros, no entanto, vinham da cidade da Lapa. A maior parte deles possui origem em antigas famílias de Curitiba e Paranaguá e, mais remotamente, nos primeiros portugueses e espanhóis que chegaram a São Paulo – além dos indígenas, que já estavam por lá.

Nos primeiros anos da Colônia São Bento, estabeleceram-se na cidade as seguintes famílias ou pessoas, vindas da Lapa, no Paraná (certamente houve mais, mas foram essas que, com ajuda do livro “Famílias Tradicionais”, do Paulo Henrique Jürgensen, e com pesquisas próprias, conseguimos identificar com certeza):

 

Anastácio José Preto, Antônio Baptista Fragoso, Belarmino Alves Pereira, Benedicto José Barbosa, Damaso Franco de Lima, David Alves Pereira, Eduardo Cavalheiro, Estelino Fernandes de Oliveira, Felippe Soares Fragoso (meu tetravô), Florentino Gomes Bueno, Francisco Antônio Maximiano, Generoso Fragoso de Oliveira (meu tetravô), Honório Alves, João Carvalho de Souza, João Baptista Fragoso, João Dias de Oliveira Santos, João Simões de Oliveira, Joaquim Lisboa, Joaquim Pinto de Oliveira Ribas, Jordão Lisboa dos Anjos, Manoel Carvalho de Souza, Manoel Ignácio Fernandes, Marculino Ferreira de Souza, Miguel Baptista Fragoso, Olímpio dos Anjos Costa, Paulo Preto de Chaves, Pedro João Ribeiro, Porfírio Carneiro de Souza, Tanargildo Alves de Miranda.

Lino Rodrigues de Almeida

 

A “Legalidade”, jornal do Dr. Philipp Maria Wolf, noticiava em 08 de julho de 1897 que Lino Rodrigues de Almeida tomou posse como vereador em São Bento do Sul. Era ele filho de Antônio Rodrigues de Almeida e Joana Maria Soares, neto paterno de meus pentavós Joaquim Rodrigues de Almeida e Maria Calisto, e neto materno de meus também pentavós Manoel Soares Fragoso e Marciana Maria de Marafigo.

Lino foi casado em Rio Negro a 28.07.1881 com sua prima Angelina Fragoso Cavalheiro, filha de meus tetravós Felippe Soares Fragoso e Flora Lina Cavalheira, neta paterna dos citados Manoel Soares Fragoso e Marciana Maria de Marafigo, e neto materno de João Florido Cavalheiro e Eduvirgens de Pontes Maciel – casal este que cremos ser de origem abastada, pois dispunha de mão-de-obra escrava na Lapa.

15. Rozina Hannusch (1909-1980)

Minha bisavó Rozina Hannusch nasceu em Fragosos no dia 07.01.1909. Casou-se com Luiz Thomé Fragoso, filho de Saturnino Fragoso de Oliveira e Joaquina Fragoso Cavalheiro. O casal teve os seguintes filhos: Cristina Fragoso, casada com Narciso da Silva; Adelina Fragoso, casada com Livarte Cordeiro de Meira, os quais se mudaram para Colombo/PR; Carlos Fragoso, casado com Maria Diva Gonçalves; Bernardo Fragoso, casado com Benedita de Melo, e Otília Fragoso, casada com Luiz da Silva.

Rozina também era de família humilde. Faleceu em Fragosos no dia 16.04.1980, provavelmente de alguma doença relacionada ao pulmão. Costumava, assim como a sogra de sua filha Otília, Francisca da Silva, fumar cigarros de palheiro. Tossia muito em seus últimos dias. Ficou algum tempo mal, de cama. Até que não resistiu mais e faleceu.

Morava numa casa próxia a de sua filha Otília Fragoso, mas quando a doença começou a a atacar, mudou-se para a companhia da filha, que com muito zelo e dedicação cuidou dela até o dia de sua passagem. Ainda houve a tentativa de levá-la a um hospital, mas ela acabou falecendo no caminho. Está sepultada no Cemitério de Fragosos.